POLITICAVOZ: Perigo ao Estado laico
Estou realmente indeciso em relação ao voto. Eu sei que é uma coisa íntima, pessoal e sigilosa. Não deveria estar aqui dizendo que concordo com esse ou aquele. Mas, diferente das outras eleições, essa parece carregar um ar de mistério, de intrigas e de algumas mentiras sinceras. Um deles diz respeito ao perigoso terreno da vida religiosa: Crença não deveria nunca ser assunto em questões políticas. Nem o artista deveria se valer de seu “prestígio” para se eleger. Mas como eu disse isso é simplesmente uma questão de escolha pessoal.
A campanha de Serra (direta ou indiretamente) tem-se valido de supostas afirmações de Dilma em relação ao aborto. Sou contra o aborto, no entanto não é por isso que eu devo acabar com a imagem da candidata. Se ela é a favor do abordo, do casamento homossexual ou gosta de carne de soja é um problema dela; pois suas idéias não podem ser ditatoriais, passarem por cima das instituições. FHC é (era) ateu e nem por isso o Brasil deixou de ser um país religioso. A discussão sobre Dilma não deveria ser essa, mas de uma porção de outras coisas.
Fazer da campanha eleitoral uma discussão religiosa é desenterrar minas desativadas pela modernidade, trazendo uma forma de violência que estava prestes a extinção: a fé participando do Estado. A elaboração de documentos explicitando que determinada pessoa não é bem vista por determinada religião é inventar mais uma vez uma lista da inquisição, não menos injusta e irracional que a anterior; mas com poucas diferenças na prática: Dilma não irá para a fogueira, mas está sendo condenada.
Conforme disse, podemos discutir sobre a candidatura da ex-ministra em diversos pontos: sua aparição relâmpago na vida pública (executivo), seu conhecimento burocrático do governo, seu temperamento; suas ações no passado, seus erros no governo Lula, a conduta em relação aos casos de corrupção entre outros; menos a tal “dignidade de toda população cristã”.
Como diz o sábio oriental: Amo o seu Cristo, mas não vejo com bons olhos seu cristianismo.
A decisão de apoio ao candidato do PSDB; por parte de alguns líderes religiosos, é, no mínimo, incoerente. Pois se a postura de um religioso é pela vida espiritual; determinando caminhos e verdades; deveriam se manifestar apenas para essa questão: Não somos favoráveis que o Estado brasileiro aceite o aborto. Nada mais do que isso.
Por passarem dos limites de suas responsabilidades, e influenciando o voto quando afirmam que o Brasil se tornará um Império do Mal caso Dilma seja eleita; é determinar que assuntos que deveriam ser travados na sociedade, limitados às questões éticas, tornem-se forçosamente uma verdade incondicional, e que as pessoas virem novamente fantoches das interpretações dos líderes, como aconteceu numa época muito recente onde os verdadeiros ditadores caminhavam com as atrocidades contra os seres humanos, chancelados pela fé.
Como diz Aquele que deveria ser guia desses religiosos: que dêem a César o que é de César; que tratem das coisas de Deus o que é de Deus.