POLITICAVOZ: Crise apenas na política
Tive uma conversa com um grande estudioso sobre os rumos da política brasileira. A conversa não se tornou chata, pois estávamos em companhia de uma boa porção de batata-frita e uma cerveja estupidamente gelada. No meio de um papo, que parecia mais de acadêmicos do que de boêmios, o sujeito vira e diz: “é disso que o povo gosta!” E abriu um sorriso malicioso como se estivesse observando alguma dondoca bem menos vestida passando por nós. “Não estou falando de mulher, estou falando do circo!”.
O papo estava levando em consideração as eleições presidenciais: Dilma no meio de um amontoado de denúncias, crescendo nas pesquisas. “O povo não liga para isso, não”. Corrupção ou qualquer nome técnico passa pelos ouvidos da população como se não fizesse qualquer sentido. É claro, não havia generalização em suas palavras, mas apenas alguns argumentos. Quebra de sigilo, manipulação da máquina e uso de influências são apenas alguns assuntos ”teóricos” que pouco reflete na “opinião” prática. O povão se preocupa mesmo com o dia-a-dia.
José está desaparecendo nas pesquisas, exatamente por isso foi muito providencial que as denúncias aparecessem agora. Não é correto que algo sigiloso por lei se torne público por crime; mas parece que não será por essa tão indecorosa ação que as pesquisas se modificaram. A história já mostrou o desinteresse de grande parte da população por coisas que não fazem parte de seu cotidiano. Além disso, por mais que mostrem evidências, ainda resta a dúvida sobre a real participação da candidata petista (terá sido óbvio apesar de sempre ter estado oculto?*) na espionagem aos familiares de gente do PSDB.
No segundo round do “eu sei o que você fez no verão passado”, parece que a sacanagem no governo tinha uma relação mais explicita e direta com a candidata. Se José não conseguir agora mais pontinhos com as “condenáveis ações do braço direito da candidata” em plena Casa Civil, terá que rever os conceitos para as próximas campanhas. Não adianta falar de qualquer coisa relacionada à ilegalidade, imoralidade; ou corrupção. Não adianta apenas denúncias, nem mesmo críticas sobre a incompetência administrativa do candidato, nem se ele faz falcatrua na complexa estrutura da administração pública. O que interessa para quase todo mundo é outra coisa.
A cerveja continua gelada. E então entramos no mundo da filosofia. O que todos querem afinal? Ser feliz parece também a resposta mais óbvia. Na prática, o sujeito está interessado em como ele pega ônibus de madrugada e chega ao trabalho, se preocupa com a mistura da marmita requentada; na roupa nova; na geladeira que ele acaba de comprar, na possibilidade de comprar uma casa. Do feijão, do arroz; da prestação do computador. Cada macaco no seu galho, cada classe com seu sonho.
E para 80% dessa população, todos os sonhos foram mais ou menos realizados com o Lula, e pouco mais da metade disso compreende que terá continuidade com Dilma. A transferência nítida de votos e de confiança: Dilma que não era conhecida de grande parte da população hoje está no imaginário de muitos. O seu papel mais difícil, então, se eleita; é fazer igual ao Lula: agir com responsabilidade quanto ao pão e deixar que o povo ache cada qual o seu circo.