POLITICAVOZ: A Copa, sempre a Copa.
Queremos a Copa do Mundo. Às vezes, quando notamos tantas coisas erradas, decidimos que ela é um erro. Mas passa. Logo passa toda nossa insatisfação. Iremos, por acaso, sair pelas ruas, cantarolando ordem e progresso em meio as marchinhas ufanistas do nosso nobre futebol. Será assim a Copa do Mundo no Brasil, essa conta que não queremos. Os desvios, as obras e toda promessa. Tudo isso não nasceu ontem, e provavelmente não tem uma data específica para morrer.
Adoramos ter que discutir nosso dinheiro em mãos erradas.
A Copa do Mundo está bem perto, mas existe tanta coisa para arrumar, que dá uma vontade imensa de sair de casa, viajar pela Europa. Ficar no Brasil em época de Copa do Mundo? Nem pensar. Vai ser uma zona. Uma bagunça. Vamos nos envergonhar dos crimes, das brigas e dos pneus queimados. Melhor mesmo passar uma temporada na Argentina. Brasileiros, vamos nos unir por uma Copa melhor! Vamos sair do país! Vamos levar conosco os políticos, eles fazem parte disso também! Vamos deixar pedra sobre pedra, nos canteiros inacabados de nossa infraestrutura. Um dia tudo vai dar certo, só espero que não seja tarde demais. Queremos a Copa, mas nesse amor incompreendido, decidimos que ela é a culpa que carregaremos para o resto de nossas vidas. Mas daí, decidimos colocar culpa em alguém.
Não há novidade em tantas tramoias. Desde a Pinta, a Nina e a Santa Maria; já não sabemos quantas caravelas passaram por aqui. A burocracia nos faria perder algumas toneladas de ouro que nem Portugal acharia vantagem em santo-pau-oco. Damos um jeito de complicar as coisas, porque as coisas complicadas não precisam de explicação. Não carece investigação, nem qualquer argumento que identifique o erro. A morte, em questão de milhares de trabalhadores, é uma estatística vil e confortante. O trabalho perigoso nos estádios não tem qualquer diferença daqueles feitos nas estradas, nas selvas e nos túneis dos metrôs. Dinheiro roubado, vida ceifada e leitos de hospitais não inibem nossa desordem no progresso.
Progredimos sempre, torto e mal acabado. Progredimos com um evento que poderia trazer alguns trocados para aqueles que trabalham com turismo. Poderia crescer uma indústria desprovida de vantagens caseiras: vamos vender mel para os alemães, guaraná para os americanos e açaí para os japoneses. Todos seriam tão vindos, mas preferem curtir a festa do futebol no sofá da sala. A oportunidade da Copa, a única vantagem, foi jogada por ralo. Ficamos mesmo com o negócio que sempre deu lucro no Brasil, independente da Copa do Mundo ou não; as negociatas e os lobbys.
Não teríamos hospitais, nem escolas. O dinheiro mal gasto nas obras não seriam distribuídos em benfeitorias para a população. Dá-se sempre um jeito do dinheiro cair em mãos desviadas, com grandes desculpas ou não. Portanto, ainda que eu tenha ressalvas contra a Copa do Mundo no Brasil, ainda acredito que ele é um cenário criado, como seria criado qualquer outro, caso o nome do Brasil não fosse escolhido há seis, sete anos atrás. A nossa imaginação ficou mais eufórica com a Copa do Mundo, e de qualquer teoria conspiratória, a Copa passou a ser nosso melhor argumento. Mas uma coisa é certa: com Copa ou não, adoramos ser enganados.