DESCONECTADO: Públicos tão distintos.
As três maiores bilheterias de filmes nacionais desse ano tratam de assuntos totalmente distintos. Pelo menos é o que parece. Enquanto a temática espírita tem seu momento de transcendência, onde o público acaba se motivando a abarrotar as salas de cinema em busca do verdadeiro sentido da vida. Outra parte se encarrega de buscar a verdade em seu momento mais real, concreto e momentâneo: existe sentido na morte? Tropa de Elite 2 e Nosso Lar são filmes que ultrapassam as questões cinematográficas, acabam por criar questões filosóficas.
Longe é a minha decisão em falar sobre os filmes. Não quero dizer aqui se vale a pena ficar sentado durante quase três horas vendo uma obra de ficção. A questão que eu proponho é entender como um povo colocou esses temas nas principais obras brasileiras. Entender como a vida após a morte, a questão religiosa e o comportamento do ser humano espiritual tem seu lado em entender a política, a polícia e o crime organizado. O lado material e o lado espiritual, as ações da sociedade e o comprometimento individual. Ambos querem dizer ao público: afinal quem nós somos?
Não assisti Tropa, mas li várias críticas sobre ele. A verdade nua e crua. O funcionamento do crime, da contravenção. Temos também nosso Al Capone. Mais do que isso, temos nosso Capitão América, nosso Superman. Em diferentes níveis de patriotismo, Capitão Nascimento não veste verde e amarelo. Ele é comum, normal e humano. Capitão Nascimento, que já quis fazer justiça em outros momentos, continua sua luta injusta. Os meios justificam os fins, a violência contrabalanceando a violência: a frase lápide da nossa sociedade é ladrão bom é ladrão morto.
Por outro lado, procuramos também a não-violência. A sublime aceitação do eterno. A mão divina que contempla a ordem, a beleza; a justiça. O cosmos (que significa harmoniza) é uma atitude que ultrapassa o momentâneo absurdo das brigas das milícias. Transcende pela fé a cura do mundo. Resgata a essência, o caráter divino em nós. Temos também nosso Gandhi, temos também nossa crença. Enchemo-nos, em alguns momentos de luta, de uma esperança inexplicável. Ladrão bom é a possibilidade do milagre.
Aceitar ou não o que representa Chico Xavier e sua obra, não é importante para a discussão. O que influi em toda a questão é a procura pela manifestação religiosa, a discussão filosófica; os exemplos e as atitudes. Fazer o bem não é rótulo, é ação. E diretamente ou indiretamente, os filmes sobre Chico querem abrir o debate sobre a possibilidade de sermos seres humanos melhores. E mais, sobre o conceito de caridade, do caminho reto; das escolhas que ultrapassam o comer, beber dos nossos dias. Também retoma propositalmente o rezar.
Como eu disse, os filmes parecem ser tão antagônicos; no entanto são muito parecidos. Mesmo que tragam suas verdades metafísicas, a ética; a beleza e a rispidez do mundo. Mesmo que manifestem vontades diferentes, entre a esperança e a luta; entre a “reforma” íntima e a “revolta” social; os dois filmes são as feridas expostas de nossas vidas; da nossa briga entre o espiritual e o material.
Os três filmes acabam nos trazendo agravos leves e esperançosos da nossa verdade espiritual e uma lesão curável de úlcera das nossas falhas sociais: Indicam caminhos interessantes, escolhas individuais e a ruptura de toda nossa inocência.