DESCONECTADO: O mundo, as coisas e o fim do mundo

(Explicação poética):

O mundo está diferente, sempre muda. Mas dessa vez as mudanças parecem ser muito maiores, grandiosas e inconsequentes. Alteração demarcada no calendário, ou não; a verdade é que não somos mais os mesmos, nem seremos. Pior ainda: não sabemos qual o fruto que será gerado pela nova humanidade: se todos os filhos dos filhos se parecerão com os pais (não tente entender a lógica dessa frase, ela é apenas musical, uma construção sonora; cheia dos poemas destruídos do contemporâneo virtual). A nova geração, propagada em massa via nuvem de dados, é a geração do futuro; mas já saturada de pretérito.

Acaba o mundo todo ano. Mas acaba se reconstruindo. Acabou no número cabalístico do ano passado, imposição de séculos pelos Maias, em seus cálculos malucos. Eles sabiam, desde então, que alguma coisa não ia sair bem na humanidade. Mas não acabou, era apenas uma figuração; uma idéia simbólica de transformação. Precisamos dessa variação de tempo, da demarcação de território no espaço; um dínamo sensorial para continuarmos vivos. O dia de dezembro foi apenas mais um dia; como também fora outras profecias tão imprecisas quanto desnecessárias.

Mas diferente das outras profecias apocalípticas que eu vivi, essa teve uma recepção diferente; meio que extraordinária. Li e reli, por impressão de outras pessoas, que essa previsão Maia era bem-vinda. Todos esperavam que eles estivessem certos, pois de algum modo não estão suportando mais a vida desse jeito. O mundo nessa loucura; e as coisas acontecendo pelo critério indecoroso do caos. Era o sorriso no rosto de uma grande parte das pessoas, quando concordavam, mesmo que no imaginário, que os Maias enfim acertassem o dia da grande destruição do mundo e a arrematação dos podres ao inferno e os santificados ao céu. Mais uma vez: Não acabou. E mais uma vez virou piada, viral e decepção para muitos.

Queremos um mundo diferente, mas estamos sem forças para mudar tudo que está sendo feito. Alguns heróis anônimos tentam interferir nessa roda gigante; com os pés pelas mãos fogem do senso comum da maioria das pessoas. Algumas vezes esses lutadores são chamados de visionários. Mas esses visionários são derrotados pelo mundo, pelas escolhas que o mundo faz; pela felicidade, pelo amor, pelo dinheiro e pelo lazer. Alguns conseguem sobreviver, mesmo sofrendo por suas escolhas. Os visionários derrotados escolheram o fim do mundo e estavam torcendo para que ele acontecesse como os Maias estavam prevendo.

Todavia os Maias não estavam prevendo o fim do mundo, mas o seu recomeço. Nós, numa necessidade absurda em jogar tudo para o alto, é que decidimos pela destruição. A imagem dos corpos caindo, dos prédios desabando e das almas sobrevoando o mundo acabado era; como num passe de mágica, nossa única esperança por dias melhores. Precisamos começar do zero, pois só assim conseguiremos arrumar esse mundo deteriorado! Ora, quanta ingenuidade a nossa, desprezo pelo que construímos.

O mundo não acabou é fato, o motivo são hipóteses. A primeira é a mais simples, mesmo sendo a mais complicada de se explicar. Deus o culpado, ou melhor, o agente. Deus não quer o mundo desmoronado, portanto não haverá força qualquer no mundo, exceto Ele; que faça o mundo sumir do mapa. Cálculos astronômicos ou não, decisão da comissão de Deuses da renovação; o mundo irá acabar somente quando Deus quiser, sem hora ou aviso prévio. Sem qualquer reclamação de ignorância quanto ao fato: o livro sagrado já diz, nas estrelinhas, sobre mudanças e mudanças e mais mudanças.

A outra hipótese, não tão menos complicada, mas ao mesmo tempo nada metafísica: o mundo não acabou, pois o homem, em sua força descomunal de auto-aniquilamento; não conseguiu ser suficientemente maior do que a natureza, em sua forma mais agressiva e prática de imunidade. A natureza age contra o homem, quando este pensa ser melhor do que a natureza. E assim caminha a humanidade, interpretando as profecias como se fosse o bendito e esperado fim de suas angústias. Não os Maias, mas os seres humanos estão errados em sua interpretação; essa parece ser a grande verdade da profecia.


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